Alemanha no início dos anos 1990, recém-unificada. Fechada para tudo e todos. Brincar de turista independente ali era uma aventura e tanto. Nem no balcão de câmbio do aeroporto de Frankfurt havia uma alma capaz de falar inglês – era alemão ou nada. Inclusive nas placas de informação. Para mim, era nada.
Eu viajava para fazer uma surpresa a minha irmã, que vivia em Munique há dez anos. Quer dizer, ela não sabia que eu estava a caminho e eu não sabia se a encontraria em casa. Tinha me organizado para descer do avião em Frankfurt e ir a Munique de trem. Mas para comprar o ticket do trem, precisava ter marcos – não se aceitavam dólares em lugar algum.
O dinheiro foi trocado e o bilhete foi comprado depois de muito desentendimento. O trem partiria em poucos minutos dali mesmo, do aeroporto – mas aquilo é uma cidade, e corri um bocado para conseguir me aboletar num vagão.
Viagem linda. Paisagens incríveis de campos todos cultivados, sem um metro de terra mal aproveitada. De repente, meu sossego acaba. O trem para. Eu teria de fazer uma baldeação – e não fazia ideia de onde ir.
Guarda na saída do vagão. Mostro meu ticket. Ele com cara de paisagem. Bitte, eu imploro. Nada. Tento pedir a informação em inglês. Nada. Faço mímica. Acho que cansado da minha insistência ele resolve baixar os olhos – tinha uns dois metros de altura. Olha o ticket e descamba a falar e falar e falar. Em alemão. Sem fazer um só gesto, sem apontar para lugar algum...
Ri tanto que caí sentada na mala. Daquele jeito não chegaria nunca!
Aí surgiu um senhor de casaca e chapéu, elegantíssimo, que para meu espanto não só se ofereceu para me ajudar: falava inglês! Explicou o que eu deveria fazer, para onde ir, quanto tempo tinha para chegar... E salvou aquela etapa da aventura. Era austríaco. Cosmopolita naquela terra de bárbaros.
Thanks God. Pode ser que só seja possível filosofar em alemão, mas viajar... Só é possível viajar em inglês!
Novo trem, novas paisagens, desembarco em Munique e entro num taxi. Motorista com turbante de indiano. Lê o papel com o endereço, abre o guia da cidade, liga o carro... E poucos minutos depois, em meio ao trânsito, começamos a ser perseguidos por um grupo de jovens carecas numa picape branca. Quando a picape bateu no taxi a primeira vez, o motorista perguntou se eu preferia descer – sim, perguntou e eu entendi, porque inglês de indiano soa muito familiar no meio daquela germanisse toda...
– São skinheads. Não nos deixam em paz. Pode ser perigoso para a senhora.
Preferi continuar. Mais alguns encostões e os rapazes cansaram de nós. Cheguei à casa de Iara sã e salva. E com muitas histórias para contar.
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