quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Romance inacabado

Minha memória me trai.
O caso que lembro não é exatamente o que se deu - segundo pessoas cujas memórias também não são lá muito confiáveis.
Mas o que importa é a essência.


Ela era linda. E vaidosa. Adorava se arrumar para sair - mesmo que fosse apenas até a loja de armarinhos. 


Sempre um pó de arroz, um lápis de sobrancelha, um toque de batom, os cabelos negros bem penteados, saia e blusa impecáveis.


Pouco depois dos 20 anos apaixonou-se por um rapaz. Não sei se o pai não considerou-o à sua altura. Se achava que o pretendente era pobre, tinha pouca educação, ou se sua resistência se explicava por seu mau humor - sim, porque esse pai era mesmo muito azedo. 



Na família tradicional, ao menos uma filha tinha de permanecer solteira, para cuidar dos pais que envelheciam. E com a negativa do pai em permitir o namoro, foi ela, justo ela, perdidamente apaixonada, quem ficou para titia.


Décadas se arrastaram. O rapaz enamorado casou-se com outra pessoa, teve filhos. Mas todas as semanas enviava flores ao seu antigo amor. E quando o pai ranzinza morreu, e aquela moça linda do passado havia se transformado numa senhorinha cheia de achaques, ele, aquele rapaz que também se tornara um senhor sizudo, e viúvo, passou a visitá-la.


Flores secas entre páginas de livros, cartões, lembranças de todo tipo foram encontradas por suas irmãs quando ela faleceu. Tudo bem guardadinho em caixas, no fundo do armário. Só então a família soube que aquele amor durara toda uma vida. 


Platônico. Secreto. Incompleto.

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