Era noite de sábado quando o avião aterrissou em Marabá, no Pará, região de garimpo. Empresas mineradoras que extraem riqueza do solo – algumas pagam uma espécie de aluguel para explorar terras indígenas – e uma multidão de migrantes busca de oportunidade de enriquecimento.
Cidade grande. Avenidas, praças largas, muita gente fazendo footing logo no cair da noite – moças com roupas minúsculas, homens com excesso de enfeites. Música com tom caribenho em alto falantes. Indígenas vestidos de cowboys montados em picapes espetaculares.
O hotel era como muitos da Amazônia – o que no sul ou no sudeste do Brasil não passaria de pensão decadente. Piscina com água turva lotada de crianças, adultos, copos, pratos de salgados. Quarto com cama de metal. Banheiro com cheiro de fossa não muito distante.
O recepcionista e o motorista de táxi não compreendem que alguém queira fazer ali um passeio turístico – tipo uma volta por pontos marcantes da cidade. Debates, prós e contras, e conclui-se que para não frustrar o visitante vale uma ida à ponte.
Na margem do rio Tocantins há uma espécie de praça alongada, com bancos e chapéus de sol, para o veraneio. A ponte rodoferroviária atravessa o rio, bastante largo. A construção não chama a atenção – é uma pontona e ponto. Mas na entrada há uma cruz imensa que não passa despercebida.
O taxista, expert em histórias de horror, as mais comuns por aquelas plagas, explicou.
– Aqui é o marco do massacre dos garimpeiros de Serra Pelada que aconteceu em 1987. Homens, mulheres, crianças, faziam uma manifestação. Pediam caminhões, tratores e a remoção de 8 milhões de metros cúbicos de terra que impediam a garimpagem segura na Serra Pelada. A polícia cercou os dois lados da ponte e atirou. Vários foram fuzilados. Muitos, apavorados, tiraram os sapatos e se jogaram no rio. Como era tempo de seca, o rio estava raso, e todos morreram – de bala ou de queda. Depois, o balanço do número de mortos foi feito com a contagem dos sapatos deixados no asfalto...
Próxima parada na estrada para Parauapebas, em Eldorado de Carajás. Troncos queimados de enormes castanheiras, plantadas à beira do caminho, sinalizam o local do massacre de sem-terra de 1996. Eram cerca de 3.500 famílias. O coronel da Polícia Militar do estado do Pará, Mário Colares Pantoja, responsável pela operação policial, foi condenado a 228 anos de reclusão, cerca de dez anos depois do ocorrido. Mas pediu a nulidade do processo e conseguiu não apenas que fosse nomeado juiz substituto para o caso: responde o processo em liberdade.
Histórias esquecidas.
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