quinta-feira, 7 de maio de 2015

Janela de oportunidade

O lugar em si não era muito amigável. Não havia plantas, flores, nada colorido. Não havia sons, ruídos que indicassem vida, a existência de homens, animais, insetos, um mosquito que fosse. Era como o nada e ela não sabia como chegara ali.
Lembrava de ter parado num cruzamento. Voltava do trabalho dirigindo seu carro. No rádio, os Rollings Stones cantavam I can get no satisfaction. O trânsito não estava ruim e ela pensava na roupa que vestiria no jantar que havia marcado para mais tarde, com amigos.
Depois ouviu um estrondo. Vidro quebrado. Tudo ficou vermelho. Quando deu por si estava naquele oco, naquele vazio que não era deserto e que de alguma maneira lembrava sua vida no dia a dia. 

Ansiava por sair dali. Por fazer algo. Por voltar à sua rotina. Não àquela sua velha rotina, pensando bem, a essa ela não queria voltar. Levar aquela vidinha chinfrim de antigamente, ah, isso não queria mais. 
Se houvesse uma chance sequer, faria tudo diferente. Engenharia? Jamais! Música, talvez. Ou Filosofia. Não viveria pior com menos dinheiro, e talvez vivesse mais satisfeita. Carro? Não! Faria o que tivesse de fazer a pé. Onibus e metro quando preciso. Mas dirigir, ah, se pudesse, desaprenderia o que sabia. Nunca mais queria estar no controle de nada.
E pensar sobre roupas? Sobre ser adequada? Estaria fora dessa se tivesse oportunidade. Se pudesse viveria só, mas cercada de vida - e não daria satisfação a ninguém sobre o que fizesse ou deixasse de fazer.
Vou-lhe contar o que aconteceu então. Alguém ligou o aparelho de ar condicionado. Um vento frio passou por seu corpo, entrou em suas narinas, arrepiou seus cabelos. Ela começou a ouvir vozes e ruídos de máquinas. Os médicos faziam o possível para extrair a bala que se alojara em sua nuca.
Ela apagou. Quando voltou a si estava em um quarto de hospital com muitos tubos ligados ao seu corpo. Uma janela lhe permitia ver um ipê florido.
Fora-lhe dada outra chance. Ela poderia fazer tudo diferente. A questão é - faria?

Nenhum comentário:

Postar um comentário