terça-feira, 12 de outubro de 2010

Luxúria e surrealismo

Chegamos a uma cidadezinha do interior da Holanda cansados da longa viagem de carro, loucos por um bom banho e uma comidinha quentinha. O que não sabíamos é que no dia 30 de abril a Holanda celebra o aniversário da rainha Beatriz. O Dia da Rainha, Koninginnedag, é data de comemoração da união nacional. Assunto sério. Feriado nacional. Tudo fica tingido da cor da realeza – cor-de-laranja – de roupas e cortinas de casas até doces, bebidas...

Havia festa por todo lado. Hotéis e restaurantes lotados. Bailes. Era como se tivéssemos desembarcado em outro planeta. 

Bem, mas encontramos um hotel. Só o banheiro do apartamento, com duas banheiras e uma enorme área livre, era do tamanho da minha casa em São Paulo. E aquilo era apenas o começo. Para jantar, a alternativa era um castelo medieval, um restaurante da grife Relais & Châteaux, isolado numa estrada plana e no meio de um campo coberto de relva. Coisa de filme.

Primeiro um vinho do porto. Depois, o menu de degustação. Dez pratos (todos minúsculos, diga-se, afinal tratava-se de degustação...).  

Cada prato era acompanhado de um vinho aberto à nossa frente, delicadamente derramado nas taças, e retirado das nossas vistas. Um sorbet e o prato seguinte, com uma nova garrafa de vinho. A sobremesa e champagne. Tudo zero quilômetro, sempre subaproveitado. O que será que faziam com o resto das garrafas de todos aqueles vinhos maravilhosos? Vai saber...

Ao final, charuto e conhaque na sala ao lado, com sofás de couro e lareira aquecendo as paredes de pedra.

O espetáculo completo de luxúria e surrealismo deve ter durado umas quatro horas. Ri aquele riso histérico e incontrolável de quem não acredita no que está acontecendo – e levei muitos cutucões por baixo da mesa para me comportar nos conformes.  

No dia seguinte, 1º de maio de 1994, ao acordar, vi na TV o acidente que matou Ayrton Senna no Grande Prêmio de San Marino, em Ímola, na Itália. Notícia em holandês. Consoantes demais. Não entendi palavra até chegar a Frankfurt, para o embarque para o Brasil. Morrera o maior piloto brasileiro de Fórmula 1. E eu nem tentara bancar a repórter.

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