Houve um tempo em que para viajar ao exterior, a partir de São Paulo, a única alternativa era Viracopos, próximo a Campinas – aeroporto pequeno e mal ajambrado já naquele tempo, e que atualmente continua tal e qual. Tomava-se um ônibus em Congonhas e chegava-se lá depois de duas horas de viagem – para encarar filas de check-in, da Polícia Federal... Do cafezinho antes do embarque...
Ela formara-se em Geografia e, aos 25 anos, resolvera voar para a Europa. Impulso. Não pensou muito no assunto. Seria uma aventura, e se há alguém que não recusa uma chance de se aventurar é ela.
Bem, já no ônibus estava se desmanchando em lágrimas... Sozinha, de coração partido, querendo bancar o bicho macho, mas meio arrependida.
Seu voo era pela Ibéria. Na fila do check-in, uma senhora de uns 60 anos resolveu puxar conversa... Passar o tempo, digamos. Com sotaque espanhol bem marcado, contou de seus filhos e netos e disse de como era bom voltar à Espanha, à sua terra de que tinha enorme saudade.
A ouvinte, um tanto desatenta, acenou com a cabeça. Até conseguiu esboçar um sorriso. E acabou abrindo a boca para algo mais. Disse que pretendia conhecer a Espanha, onde nascera sua mãe.
A senhora se animou. Sugeriu cidades, passeios, lugares onde ficar... E tudo foi cuidadosamente anotado pela viajante que já não se sentia assim tão disposta a uma aventura aos moldes sem lenço e sem documento.
Depois foi silêncio. Check-in, sala de embarque, fila para subir ao avião. No aperto da classe econômica, olhos vermelhos, fungando... Tanto que uma aeromoça se aproximou e perguntou, na maior gentileza:
– A senhora está bem?
Um sorriso foi a resposta que a aeromoça viu. O que ela não ouviu (ainda bem...) foi o que ia pela cabeça da passageira:
– Claro que não estou bem, sua burra!
O avião levantou voo. Uma hora depois a aeromoça estava de volta, pedindo que ela a acompanhasse à primeira classe.
– Algo errado?
Desta vez, quem sorriu foi a aeromoça. Acontece que ali, muito bem instalada, estava aquela senhora espanhola da fila do check-in, que acenava e sorria com ares de `Seja bem vinda!`.
Jantaram como amigas de longa data. Tomaram uma taça de vinho, foram servidas com toalhas e guardanapos de linho e talheres de prata. Conversa vai, conversa vem, a convidada esqueceu suas tristezas.
Voltou ao seu lugar para dormir, mas logo pela manhã foi novamente chamada para tomar café com a nova amiga, se é possível defini-la assim. Elas tinham falado sobre historia familiar, tinham reconhecido a cultura de uma e de outra... Mas a garota não sabia o motivo de tanta gentileza, o que a senhora fazia da vida... Havia muitas dúvidas não resolvidas.
Ao final da refeição, a senhora ofereceu à companheira de viagem um cartão de visitasc– cartão azul, com borboletas estampadas...
Uau! A curiosidade ficou acesérrima! Pouso em Madrid. Ela não resistiu: perguntou à aeromoça:
– Quem é essa senhora? Parece solitária... Nos conhecemos no aeroporto e ela foi tão gentil durante o voo...
– Não sabe quem é ela? Pois é a embaixatriz da Espanha no Brasil!!!
A aventura começara bem. Muito bem...
Esta é mais uma das histórias de vida da minha amiga Adélia Manus. Ela conta, eu escrevo. São muitas. Imperdíveis. Foi ela a moça de 25 anos que voou aos prantos para a Espanha. Aguardo para saber o que veio depois...
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